Em 1825, os parentes de um paciente que estava se recuperando de uma fratura no Hospital St. George, em Londres, viram o familiar deitado em lençóis molhados e sujos, cheios de fungos e vermes.

Segundo o relato, nem o homem aflito, nem os outros com quem dividia o espaço, se queixaram das condições do local, comuns aos hospitais da época.

Tudo cheirava a urina, vômito e outros fluidos corporais. O odor era tão intenso que a equipe, às vezes, caminhava com lenços pressionados contra o nariz.

Os médicos, entretanto, também não tinham aroma de rosas. Esses profissionais raramente lavavam as mãos ou seus instrumentos de trabalho – exalavam o que era chamado, de forma elogiosa, de “fedor tradicional do hospital”.
Ignaz Semmelweis & The 4 Laws of Communication

As salas de cirurgia eram tão sujas quanto os cirurgiões que trabalhavam nelas. Conforme o relato, no meio da sala, havia uma mesa de madeira manchada com traços que revelavam os corpos que haviam passado por ali, enquanto o chão estava coberto de serragem para absorver o sangue que escorria.

E havia alguém que tinha salário maior do que o dos médicos: o “caçador de insetos”. Seu trabalho era livrar os colchões dos piolhos.

Os hospitais eram um terreno fértil para a infecção. Muitos doentes e moribundos eram alojados em salas com pouca ventilação ou acesso a água limpa.

Nesse período, era mais seguro ser tratado em casa do que em um hospital, onde as taxas de mortalidade eram de três a cinco vezes maiores do que em ambientes domésticos.

Pintura "A Clínica Agnew" (1889), de Thomas Eakins

Getyimmages – Essa pintura óleo é “A Clínica Agnew” (1889), também de Thomas Eakins, representa uma sala de operações mais limpa, com participantes de jalecos brancos. Mais tarde, medidas higiênicas seriam maiores, até chegarmos às salas de operações que conhecemos hoje

No meio daquele mundo que ainda não entendia os germes, um homem tentou aplicar métodos científicos para impedir a propagação de infecções.

Ele se chamava Ignaz Semmelweis.

Este médico húngaro tentou implementar um sistema de lavagem das mãos em hospitais de Viena na década de 1840 para reduzir as taxas de mortalidade nas maternidades.

Foi uma tentativa digna, mas fracassada. Semmelweis acabou sendo demonizado por seus colegas.

Depois, no entanto, ele ficou conhecido como o “Salvador das Mães”.

Um mundo sem germes

Semmelweis trabalhava no Hospital Geral de Viena, onde a morte perseguia os doentes tão regularmente quanto em qualquer outro hospital da época.

Antes do triunfo da teoria dos germes, na segunda metade do século 19, a ideia de que as más condições ​​dos hospitais desempenhavam um papel importante na disseminação de infecções e de doenças não passava pela cabeça de muitos médicos.

“Para nós, é difícil imaginar um mundo em que as pessoas não sabiam da existência de germes ou bactérias”, diz Barron H. Lerner, da Faculdade de Medicina Langone da Universidade de Nova York.

Ilustração mostra o médico Ignaz Semmelweis lavando as mãos com água com cloro antes de uma operação

Gettyemages – Ignaz Semmelweis lavando as mãos com água com cloro antes de uma operação

“Em meados do século 19, acreditava-se que as doenças se espalhavam por meio das nuvens de um vapor venenoso, no qual partículas de matéria em decomposição chamadas ‘miasmas’ eram jogadas no ar”.

Desequilíbrio

Entre as pessoas em maior risco estavam as mulheres grávidas, particularmente as que sofreram com problemas durante o parto, pois as feridas abertas eram o habitat ideal para bactérias que médicos e cirurgiões carregavam de um lado para o outro.

A primeira coisa que Semmelweis notou foi uma discrepância interessante entre o atendimento em duas salas obstétricas do Hospital Geral de Viena, cujas instalações eram idênticas.

Uma delas era ocupada por estudantes de medicina do sexo masculino, enquanto a outra estava sob os cuidados de parteiras.

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A sala atendida por estudantes de medicina tinha uma taxa de mortalidade de mulheres três vezes maior do que o local supervisionado pelas parteiras.

Anteriormente, funcionários do hospital já haviam percebido o desequilíbrio, mas atribuiram a discrepância aos estudantes homens, que seriam mais severos no trato com as pacientes do que as parteiras. Acreditava-se que esse fator comprometia a vitalidade das mães, tornando-as mais suscetíveis ao desenvolvimento da febre puerperal.

Porém, Semmelweis não se convencia com essa explicação.

Demolir e reconstruir’

Antes de entender bem a questão dos germes, era difícil encontrar um remédio para a sujeira em hospitais.

O obstetra James Y. Simpson (1811-1870), o primeiro médico a demonstrar as propriedades anestésicas do clorofórmio em humanos, argumentou que, se a contaminação não pudesse ser controlada, os hospitais deveriam ser periodicamente destruídos e reconstruídos.

O cirurgião John Eric Erichsen (1818-1896), autor de um livro sobre cirurgia no século 19, concordou: “Uma vez que um hospital se torna incuravelmente afetado pela piemia (infecção purulenta), é impossível desinfetá-lo por quaisquer meios higiênicos conhecidos, como também é impossível desinfetar um queijo velho dos vermes que foram gerados nele”, escreveu ele.

Para a dupla, a única solução era a mesma: a demolição do hospital.

Gettyimages – Os médicos, como podem ser vistos neste desenho de Jacques-Pierre Maygrier, de 1840, usavam as mãos ao fazer os partos, mas geralmente não eram tão limpas quanto nesta ilustração

Semmelweiss, porém, acreditava que havia medidas menos drásticas.

Os médicos dissecavam cadáveres e em seguida iam fazer partos sem sequer lavar as mãos, isto pode parecer uma loucura nos dias de hoje, mas para ele, a loucura era a necessidade de lavar.

Depois de concluir que a febre puerperal foi causada pelo “material infeccioso” de um cadáver, ele instalou uma bacia cheia de solução de cal e cloro no hospital e começou a salvar a vida das mulheres com três palavras simples: “lave as mãos”.

Aqueles que passaram da sala de autópsia para as salas de parto tiveram que usar a solução antisséptica antes de atender pacientes vivos.

As taxas de mortalidade na sala de estudantes de medicina despencaram. Em abril de 1847, o índice era de 18,3% dos pacientes. Um mês depois do início da lavagem das mãos ser instituída, em maio do mesmo ano, as taxas caíram para pouco mais de 2%.

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O experimento continuou: os resultados de Semmelweis foram muito convincentes, seus dados foram coletados e certamente salvaram a vida de muitas mães durante o período.

No entanto, ele não conseguiu convencer todos os colegas dos méritos de sua teoria de que os incidentes de febre puerperal estavam relacionados à contaminação causada pelo contato com cadáveres.

Aqueles dispostos a testar seus métodos frequentemente o faziam de maneira inadequada, produzindo resultados desanimadores.

“Você deve ter em mente que o que ele estava dizendo – embora não com essas palavras – era que estudantes de medicina estavam matando mulheres, e isso era muito difícil de aceitar”, explica Lerner.

Depois de várias resenhas negativas de um livro que ele publicou sobre o assunto, Semmelweis criticou seus algozes e chegou a rotular médicos que não lavavam as mãos de “assassinos”.

Mesmo tendo dalvo um número imenso de mulheres na Hungria, suas ideias não eram aceitas e isto levou o médico a um estado de depressão.

Em certa situação, a pretexto de ir visitar um novo médico, um amigo o levou a um asilo para doentes mentais,  para interná-lo, como ele reagiu, foi espancado brutalmente e os ferimentos desta surra gangrenaram, o que provocou sua mortem duas semanas depois. Semmelweis tinha apenas 47 anos.

Uma das últimas coisas que Semmelweis escreveu é perturbadora:

“Quando revejo o passado, só posso dissipar a tristeza que me invade imaginando o futuro feliz em que a infecção será banida… A convicção de que esse momento deve chegar inevitavelmente mais cedo ou mais tarde alegrará o momento de minha morte”.

Assim como ocorreu naquela época, toda mudança aos hábitos e=ou crenças, esbarram com uma imensa resistência.
O bom senso e a visão analítica e aberta da realidade, precisam ser cultivados a cada dia, para que não corramos o risco de ser apoiadores do retrocesso.

Fonte: Wikipédia e BBC